
Ao longo das últimas semanas temos marcado a mudança do ano a que muitas vezes se chama Samhain. Este é o antigo nome celta para a celebração que acontece por todo o mundo, com muitos nomes: Hallowe'en, Dia de los Muertos, Dia de Todos os Santos. É a altura em que o véu entre os mundos dos vivos e dos mortos, entre o visível e o invisível, entre nós humanos e as fadas e espíritos, é fino. Nesta altura, podemos refletir sobre o passado, o presente e o futuro, os que vieram antes de nós, e os que virão depois. Samhain ocorre na altura das últimas colheitas antes do inverno, e incita-nos a expressar gratidão à Natureza. O acto de trabalhar em conjunto com a terra também serve para fortalecer os laços dentro de uma comunidade, e a celebração de Samhain ajuda-nos a reconhecer e apreciar cada pessoa.

A 27 de Outubro colhemos o milho azul que plantámos há exatamente 6 meses. Como um, recolhemos as espigas, com imensa gratidão pelas pessoas que contribuíram ao plantar, regar, mondar, e pela terra que nos dá tanto. Os Hopi dizem que o milho azul tem em si a sabedoria, o que significa que o processo de plantar, cuidar, colher e comer o milho nos mantem em alinhamento com os ciclos da Natureza. Agora estamos a honrar este conhecimento e os antepassados, para lembrar e reconhecer que eles continuam a andar entre nós, a viver entre nós.

Uma semana depois, a 5 de Novembro, reunimo-nos em grupo de novo para colher as nossas queridas castanhas, no lindo terreno dourado do souto, à beira da Floresta. Passámos o dia fora, com o sol quente de Outono, a abrir ouriços e a tirar aquele fruto tão nutritivo e delicioso. Partilhámos o almoço, num óptimo piquenique com sopa. Trabalhando em equipa, todos nos sentimos ligados, uns aos outros e ao souto e às árvores. Durante o almoço, refletimos como, ao longo dos anos, temos dados a estas árvores o nosso amor e atenção, e, na altura da colheira, sentimos as suas dádivas de volta.
Enquanto trabalhávamos na colheita, começámos a focar a nossa intenção – a nossa meditação pessoal, podemos chamar-lhe – para a cerimónia do próximo dia, no sábado dia 6. Tínhamos colhido em conjunto, agora estava na altura de celebrar em conjunto! Esta celebração aconteceu na Medicine Wheel (Roda Medicinal), um lugar mágico nos socalcos, acima do antigo solar, em breve Nature Spa. Neste sítio, há um anfiteatro de pedra, construído à muitas gerações. E dentro desse espaço está a nossa medicine wheel, um círculo de pedras que representam as etapas do ano.
Cada um de nós teve uma tarefa. Os guardiães do fogo começaram de manhã cedo, a recolher lenha para o inverno, e para o fogo sagrado da cerimónia. Todos preparámos comida e bebida para o festim que se seguiria. Reunimo-nos em grupo, e caminhámos colina acima, pelos socalcos, até à Medicine Wheel. Demorámos o nosso tempo a olhar em redor, a ouvir em redor, a sentir em redor. Reparámos nas cores, flores, frutos, animais, e presenciámos de novo a herança dos antepassados desta terra.
Todos reunimos elementos para decorar a Medicine Wheel – o espaço ritual. O arco de entrada e a pedra de Samhain ficaram cobertos de ramos de oliveira, hera, bagas de espinheiro, flores silvestres, bamboo, laranjas, maçãs, figos, castanhas, cogumelos.
Entrámos na Medicine Wheel pelo arco decorado, no sentido dos ponteiros do relógio, na direção do ano. Juntámo-nos em círculo e os guardiães do fogo fizeram um fogo sagrado quente e forte. Convidámos para se juntar ao círculo aquelas pessoas que não estavam presentes mas que queríamos ter perto, por isso chamámo-las por nome. Neste círculo de confiança, sem julgamento e escuta profunda, cada um de nós partilhou onde estava neste momento, como nos sentíamos, e a nossas intenções em como avançar nas nossas vidas. Incluiu deixar para trás algumas coisas do passado para criar espaço para o que estamos a criar nas nossas vidas. Estas coisas que soltamos, oferecemos ao fogo. Cada um de nós partilhou, ouviu e encorajou os outros.
Quando deixamos o círculo, mais uma vez na direção dos ponteiros do relógio, sentimo-nos mais leves, felizes e unidos como grupo. Caminhámos de volta para a casa com sorrisos e abraços. Terminámos de cozinhar um festim feito de castanhas, abóboras, marmelos, queijo, pão e vinho, e comemos com deleite. Até cantámos e tocámos instrumentos que não tinham sido tocados há anos! Fomos para casa tarde, sob um céu cheio de estrelas brilhantes.
Embora o que fizemos em conjunto tenha sido uma cerimónia, com ritual, no fundo sentimos que foi normal. Estivemos juntos, presentes, caminhámos a bela encosta acima, apanhámos incríveis flores e frutos, fizemos uma fogueira quente, partilhámos os nossos sentimentos e intenções honestas, e depois fizemos comida deliciosa e comemo-la juntos em celebração. São tudo coisas diárias, que não são necessariamente especiais ou extraordinárias. Mas que acabaram por ser, porque as fizemos com os corações abertos, com espírito de valorização, e com uma intenção definida.


Senti-me honrado de ter uma tarefa importante na minha primeira celebração. Foi uma viagem ao longo dos dias que a antecederam, de aceitar e aprender a controlar fogo, algo que me era alheio.
Senti a necessidade de documentar a preparação, mas a falta de fotografias da cerimónia em si foi prova do investimento emocional de todos nós. De estar totalmente num lugar e em participação ativa. E ter os testemunhos pessoais das pessoas no círculo fez-me sentir mais perto delas.
Szymon
É Samhain
A escuridão chama
Preparamo-nos
Para deixar o rotineiro
E atravessar o limiar
Para encontrar os nossos antepassados
É Samhain
A escuridão chama
Rodeados pela graça do Outono
Ascendemos cem degraus
E navegamos um caminho ancestral
Unidos numa canção de Paz
É Samhain
A escuridão chama
Seguindo a nossa bússola interna
Cada um de nós recolhe um objeto
Símbolo da nossa transformação
Para oferecer como presente
É Samhain
A escuridão chama
Passamos pelo portal
Para o abraço dos antepassados
E partilhamos o grande mistério
Por toda a terra sagrada
É Samhain
A escuridão chama
Na nossa gargalhada e no nosso luto
Cada um detém um lugar no círculo
Tudo muda
Somos um.
É Samhain
A escuridão chama.
Agora durante o Samhain, reconheci que o Beltane não foi uma cerimónia isolada. As promessas que fiz na altura têm sido cumpridas e completadas, de alguma forma. Partilhar estas promessas fez-me manter a intenção de as cumprir. Por isso enquanto as intenções do Beltane ainda decorrem, outras novas surgiram e também são para cumprir, com o apoio e confiança do círculo de pessoas.
Céu

Foi uma comunhão sagrada, senti que foi como abrir uma porta e passar para o outro lado, e pude dar a mim próprio um presente maravilhoso. Não teria sido possível com tanta profundidade se não tivesse sido neste círculo. Estou muito agradecido por isso. Sinto-me leve e agradecido. Foi uma grande libertação ao deixar ir algo no fogo. E quando as pessoas falam do coração, toda todos, se realmente estivermos a ouvir.
Dino

Leve/Luz. Incrível. Alívio.
Marco
Foi um momento muito significativo, que vou manter na minha memória como um marco para mim e para o futuro.
Pietro
Durante o Samhain, senti-me muito perto dos outros mundos, do mundo da floresta, e dos meus amigos e família que já passaram para o outro mundo.
David
Tocaram-me muito as partilhas que aconteceram no círculo, especialmente porque tínhamos várias gerações representadas. Foi como um momento intemporal, que poderia ter acontecido a qualquer altura da história da humanidade. E é lindo saber que, qualquer a nossa idade, continuamos a passar pelos mesmos ciclos, e a viver histórias intermináveis por que toda a gente passa ou já passou. Fiquei muito grata aos homens, particularmente, que partilharam testemunhos vulneráveis no nosso círculo, sem vergonha, com confiança, mostrando que isto é possível para toda a gente.
Catarina

