A Floresta Negra
Willow vivia com os seus pais no limite a norte de uma floresta negra, tão vasta que se dizia que ninguém sabia ao certo, qual a sua extensão. Ela era pequena e brincava no prado perto da sua casa. À medida que ia crescendo, ia acompanhando a sua mãe até ao limite da floresta para colherem cogumelos, frutos silvestres e bagas, flores comestíveis e raízes. O pai dela ensinou-a a caçar coelhos, a pescar no rio e ela acostumou-se a trazer pedras para casa dos seus passeios diários. Apesar de não poder entrar na floresta sozinha, ela pensava cada vez mais no mundo que existia para além dela. Quanto tempo levará para chegar ao outro lado? Que tipo de vida ela encontraria lá? Não havia forma de saber as respostas a estas perguntas. Quando ela fez 16 anos, ela subia com frequência aos altos ramos dos grandes carvalhos na margem da floresta de onde ela olhava para o seu interior escuro e imaginava as coisas mágicas que poderia lá encontrar. Mas apenas fazendo algo se pode verdadeiramente saber.
Às vezes, à noite, enquanto a mãe da Willow penteava os seus longos cabelos dourados, ela partilhava os seus pensamentos e sonhos com os seus pais. Enquanto ouviam os seus anseios, eles aperceberam-se de que a Willow tinha sido tocada pelo espírito de aventura e não tardaria a embarcar na grande viagem da sua vida. Decidiram aproveitar cada momento de cada dia no qual tinham a Willow nas suas vidas, sabendo que em breve ela iria embora.
Quando esse dia chegou nem estava planeado nem preparado. A Willow estava a caminhar no limite a norte da floresta negra, usando o seu manto de pele e o seu arco e flechas e a sua faca de caça quando viu, à distância, algo que ela nunca tinha visto antes. Era um portão antigo, feito de madeira de salgueiro e uma mulher idosa com cabelo branco e um rosto muito enrugado que contava milhares de histórias, parada junto ao portão enquanto fumava, usando um pequeno cachimbo.
A mulher idosa observava a Willow, imóvel, à medida que se aproximava, como se estivesse a estudá-la no mais profundo do seu coração. Willow teve uma sensação estranha que nunca antes sentira de já antes ali ter estado e que a velha senhora era alguém que ela conhecia desde sempre como se fosse num sonho. Dirigiu-se a ela e entreolharam-se, olhos nos olhos. Willow ficou encantada com a profundidade insondável e a bondade no olhar da idosa. " Quem és tu, avó?" Perguntou a Willow. " Eu sou a porta e sou a chave. Através e mim, transformar-te-ás na pessoas em que te vais tornar." O coração da Willow ficou acelerado ao ouvir esta declaração.
" Nunca tinha reparado neste portão antes". A idosa acenou e soltou uma baforada. "Há algum caminho para além do portão?" A velha senhora voltou a acenar e sorriu. "Onde é que o caminho vai dar?" O rosto da senhora abriu-se num sorriso simpático e disse: " Este portão leva-te ao teu futuro, minha querida. É o portão do destino. Estás pronta para entrar? Porque só fazendo algo se pode verdadeiramente saber."
A idosa afastou-se e a Willow viu um belo caminho a descer por uma clareira de sol e à distância, uma mãe veado e os seus filhotes a brincar. Ela entrou pelo portão, e começou a saltar ao longo do caminho, virando-se apenas uma vez para dizer: "Obrigada, avó" mas já não estava lá ninguém; apenas o portão do destino, caído e aberto.
A Willow seguiu o caminho. Foi entrando cada vez mais profundamente na floresta, debaixo de grandes carvalhos e faias. Num ribeiro, viu uma família de cisnes e uma toca de lontras. E, à medida que caminhava, a magia da floresta foi-se-lhe entranhando cada vez mais. Viu maravilhas que nunca tinha visto antes e embeveceu-se com todas. Quando ficou demasiado escuro, ela estava tão cansada que simplesmente se deitou no musgo macio e adormeceu, pacificamente, até ao amanhecer. Ela continuou a percorrer o caminho na manhã seguinte que a levou por vales, através de cavidades e à volta de árvores tão grandes que não conseguia ver o topo das suas copas. Ela comeu nozes e bagas, que eram gordas e doces e bebeu água directamente do riacho ou da cascata e sentiu que estava no paraíso. Em momento algum parou para pensar em regressar. Sentiu que quando chegasse a altura, seria fácil dar a volta e seguir o mesmo caminho, de volta ao antigo portão e à sua casa no prado. Até esta altura, só fazendo algo é que se pode conhecer verdadeiramente.
Três dias depois, o caminho terminou abruptamente e deparou-se com um silvado tão grande e escuro que parecia ser sempre noite no seu interior. Havia vários trilhos de animais que permitiam passagem por entre as silvas e a Willow escolheu um deles, mas o progresso foi lento. O caminho tinha sido feito por javalis e texugos e ela teve de rastejar sobre a sua barriga, sendo muitas vezes arranhada por espinhos ou pela terra áspera. As suas roupas ficaram emaranhadas e rasgadas. Os seus cabelos dourados eram por vezes puxados e ela tinha que lutar para se libertar. Mas a Willow não se importava, isto era uma aventura e ela estava curiosa para saber o que encontraria do outro lado. Quando chegava a noite, ela não podia ir nem para a frente nem para trás, pelo que tinha de dormir onde estava. Pela primeira vez na viagem, ela sentiu medo. E se um lobo ou um javali a encontrasse lá? Mas ela passou a noite sem se queixar e acordou com a memória de um sonho estranho, em que a velha mulher cantava sobre o seu corpo, como se ela tivesse morrido.
Quando conseguiu sair das silvas, tarde nessa manhã, viu-se num vale com um rio, debaixo de uma elevada queda de água rochosa. Ela tirou as suas roupas rasgadas e mergulhou no rio para se banhar debaixo da água do ribeiro. E então ela começou a chorar. No início, chorou com alívio, e depois com deleite pela beleza da clareira mágica. Mas em breve, chorou sem razão. Chorou pelo passado que tinha deixado para trás, pelo futuro desconhecido e chorou porque estava sozinha e com medo. Ela sabia que não havia maneira de refazer os seus passos e regressar a casa. Deitou-se durante a maior parte do dia junto ao rio e, eventualmente, fez uma pequena fogueira e apanhou peixe no rio para o jantar.
Ela subiu ao topo da cascata rochosa. O rio era um riacho de montanha borbulhante, com picos ainda mais altos em toda a volta e a vista sobre o topo da floresta era espectacular. Ela foi lá muitas vezes ao amanhecer para ver a floresta ganhar vida com a queda do sol. Este paraíso ribeirinho tornou-se a casa da Willow durante as semanas seguintes. Tinha tudo aquilo de que ela precisava. Ela encontrou cogumelos, bagas, frutos secos, frutos silvestres e raízes e nunca teve fome.
Uma noite, estava sentada à fogueira a partir nozes para comer com a sua salada, quando uma canoa feita à mão apareceu à sua vista e um homem usando apenas calções e uma bandana deslizou até à costa. Ele era talvez tão velho quanto o seu pai e sorriu para ela muito gentilmente. Tinha estado a pescar e o resultado da pescaria estava no chão da sua canoa. Quando ele falou, foi numa língua que ela nunca tinha ouvido antes e ele viu rapidamente a estranheza no seu rosto e parou. Em vez de falar, acenou-lhe para subir para a canoa e fez gestos de comer e beber, que foram claramente uma espécie de convite. Willow sorriu, pegou no que ela tinha preparado e entrou na embarcação de madeira com o seu companheiro saiu a jusante. A floresta desta região era verde e exuberante, com videiras e flores selvagens para onde quer que ela olhasse. O rio serpenteava através da floresta e corriam rapidamente pela corrente até que, de repente, a terra se abriu de um lado e ela viu um prado, com uma pequena cabana de madeira recuada do rio. Havia crianças a mergulhar e a nadar no rio e quando a canoa chegou, gritaram 'Papá, papá!' e correram para os cumprimentar.
Willow entrou na cabana e descobriu que o seu anfitrião se chamava Ermidio, a sua esposa era Clarisa e eles tinham cinco filhos. Plantaram milho nas encostas altas, e mantiveram uma vaca no seu prado, que lhes fornecia leite, manteiga e queijo. Eram simples agricultores e Willow instalou-se rapidamente para ajudar nas tarefas domésticas. Ela adorava ordenhar a vaca e brincar com as crianças. Clarisa ensinou-a a cozinhar com milho e com o passar do tempo, ela aprendeu a compreender a sua língua. O mundo deles era feito de coisas simples, de gargalhadas e de trabalho árduo.
Através do Ermidio e da Clarisa, Willow conheceu todas as pessoas que viviam nesta parte da floresta e descobriu que tinha uma profunda afinidade com as crianças. Ela gostava especialmente de lhes contar histórias, de cantar com elas e de as encorajar a fazer arte de todos os tipos e como uma coisa leva a outra na vida e a bondade gera bondade, a comunidade pôs-se a trabalhar para construir uma escola e a Willow tinha encontrado o seu lugar. Pois só fazendo algo é que se pode conhecer verdadeiramente.
Muitas coisas aconteceram depois disso, demasiadas para as mencionar todas. A Willow conheceu Caleb, apaixonou-se e teve quatro filhos seus. Caleb era um carpinteiro com um profundo amor pela madeira. Construiu uma casa de simplicidade e beleza de tirar o fôlego e ao nascer cada criança, acrescentava outra divisão. Através da sua proximidade com as plantas, descobriu um dom para a cura com ervas e as pessoas vinham de longe para procurarem a sua orientação. Quando chegou aos quarenta anos de idade, tomou um tempo para si própria e viajou para longe, para lugares distantes. No seu regresso, a Willow tornou-se mais profunda e tinha mudado. Agora tinha histórias do mundo para além da floresta - de montanhas, oceanos e desertos, mas a sua viagem tinha servido principalmente para aprofundar a sua ligação com a floresta, as plantas, os animais, os rios e as árvores. Ficou largamente conhecida como a mulher sábia da floresta e era amada por todos.
Os filhos dela cresceram e fizeram as suas próprias viagens. Como avó, ela era mais carinhosa e mais paciente do que aquilo que pensava que era possível. Mas só fazendo algo é que verdadeiramente se pode saber. Então, chegou um dia, quando ela era velha, com cabelo branco, uma cara profundamente enrugada que contava mil histórias e fumava um pequeno cachimbo, despediu-se de todos e começou uma longa caminhada em direcção ao Norte. Caminhou por trilhos que conhecia, pois a maior parte da floresta era agora do seu conhecimento, mas a certa altura, foi além de tudo o que podia saber ou recordar. Estava agora profundamente cansada e, quando chegou ao limite norte da floresta, ficou junto a um portão de salgueiro curvo, e acendeu o seu cachimbo. Ficou ali imóvel durante muito tempo, a dar baforadas no seu cachimbo e a olhar para o belo prado para além do seu mundo.
Ao longe, viu uma jovem mulher a caminhar na sua direcção, com cabelo dourado, e a usar um manto de pele. Olhou para aquela criança, olhando no fundo do seu coração, e sentiu uma estranha sensação de já ter estado ali antes e de que esta jovem era alguém que sempre conheceu, como se estivesse num sonho. À medida que a rapariga se aproximava, entreolharam-se nos olhos uma da outra e a Willow ficou encantada com a profundidade insondável e a bondade no seu olhar. A rapariga falou: "Quem és tu, avó?" e ela deu por si a responder com uma estranha frase: 'Eu sou a porta e sou a chave'. Através de mim transformar-te-às na pessoa em que te vais tornar". 'Nunca tinha reparado neste portão'. A Willow acenou com a cabeça e soltou uma baforada. 'Há algum caminho para além do portão?' Willow acenou de novo com a cabeça, e sorriu. 'Onde é que o caminho vai dar?'
Willow sentiu o seu coração acelerar e, de repente, lembrou-se de tudo: do veado, do silvado, da clareira, da escola, dos filhos e dos netos, das plantas, da magia, da medicina. E lembrou-se da sua vida no prado, há tanto tempo e dos anseios que a guiaram. O seu rosto abriu-se num sorriso simpático e disse: " Este portão leva-te ao teu futuro, minha querida. É o portão do destino. Estás pronta para entrar? Porque só fazendo algo se pode verdadeiramente saber"
Willow afastou-se e a jovem mulher viu um belo caminho a descer por uma clareira de sol e à distância, uma mãe veado e os seus filhotes a brincar. Ela entrou pelo portão, e começou a saltar ao longo do caminho, virando-se apenas uma vez para dizer: "Obrigada, avó" mas já não estava lá ninguém; apenas o portão do destino, caído e aberto.